sexta-feira, 14 de maio de 2010

Minha própria Alice

Pois não é que esta Dama saiu de Caio Fernando Abreu e caiu em Lewis Carroll?

Um movimentado ônibus, passando na “porta” de uma grande favela (ou melhor, “comunidade”), ou seja: certeza de boas estórias quase todo dia...e dessa vez encontrei Alice alguns muitos anos depois do momento em que Tim Burton resolveu encontrá-la para o blockbuster desta temporada...

Muito mais de 40 anos (ou seria o tempo agindo sobre ela, destruindo sua juventude? Talvez fosse muito mais nova, mas não acredito), cabelo tingido de vermelho, quase cobre, curto, jaqueta branca e calça branca, brincos vermelhos, baratos, chamativos.

Esta era minha Alice, a nossa Alice de hoje.

Eu acredito que nossa Alice era lésbica e namorava uma moça mais jovem (mas não tão mais jovem, não levemos o Sr Carroll para a realidade de forma tão contumaz), tão desvairada da vida quanto ela, mas, enquanto a nossa Alice era chamativa na sua forma, sua companheira (sua Gabrielle?) era uma cantora de celular...aliás, naquele local haviam ao menos três celulares tocando músicas, para todos os gostos e irritação (tímida) geral.

Pois bem, Alice possuía um cartão destes de ônibus, e não é que o malvado resolveu dar problema para fazer passar sua donzela? Cobradora reclama, cobradora exige, Alice se vê perdida no mundo dos espelhos, e pede a todos, um a um, que contribua para sua causa: salvar o amor. (Bem, na verdade eu quem estou inferindo isto do que vi, na verdade ela simplesmente saiu pedindo, e só)

De um ônibus cheio, três ajudaram, uma moça e dois rapazes...ela agradeceu e despejou benções a todos que ajudaram (acredito que até nos que não ajudaram, eu me senti abençoada, devo dizer!), a moça, levando a ferro e fogo a bondade maior e inata da mulher (talvez), ofereceu mais da metade do valor necessário, por bondade ou vontade de ver o show terminar, e então nossa Alice vira uma pomba gira bem brasileira:

- Quero que você fique com isso moça (enquanto tenta se manter de pé, tenta retirar os brincos baratos, talvez mais baratos que o preço da passagem), por favor.

Pois nossa moça, a gentil, não se recusou, ou simplesmente temeu se recusar, e aceitou e então o silêncio que não se pode descrever...silêncio.

Eu saltei (ou soltei?) em um ponto e vi que nossa Alice soltou com sua Gabrielle no outro ponto...pois bem, fui seguir minha vida de Dama da Noite, esperando ver novos personagens, mas Alice não desistiria de mim e de minha narrativa: enquanto eu aguardava outro ônibus para voltar, algum tempo depois, quem se posta a meu lado? Alice...

Ela nem lembrou que eu estava naquele ônibus anterior e a vi, também não a lembrei, discutimos amenidades (eu tinha medo de começar a perguntar demais e devorar nossa Alice, agora sozinha, talvez temesse perguntar que fim levou nossa Gabrielle, a barda), e lá foi ela pegar o mesmo ônibus, só que no sentido contrário, eu? Não tive coragem de subir no mesmo ônibus, resolvi deixar Alice com sua toca e procurar a minha própria...

Não queria mais emoções.

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